20 de agosto de 2017

Submente


eu vou sussurrar e gritar em uníssono repetidamente aquele mesmo mantra que vira e mexe insiste em nos engolir.
eu vou sussurrar e gritar até te convencer de que eu sei muito bem o que eu estou fazendo
porque eu sou um ser humano e seres humanos são racionais e seres racionais sabem exatamente o que fazem.
eu vou sussurrar e gritar até que você entenda que eu sou dona de mim
e como dona de mim, sou capaz de domar tudo que é meu não só por me pertencer como também por ser humana e racional
porque meu coração é meu e o que é meu sou eu e eu sou humana e racional
eu sei o que eu estou fazendo
eu sei o que eu estou sentindo
eu estou no caminho certo
por mais que o errado esteja tão perto.
eu vou sussurrar e gritar (e gritar) até que o meu sistema nervoso esteja tão ocupado em te convencer de que eu estou no comando que as algemas vão afrouxar e todo o esquema vai por água abaixo
e eu, sem voz e sem força restantes, terei de admitir a farsa que somos
e esquecer que eu me pertenço e que sou humana e racional

tento me convencer de que peguei o caminho de volta dessa floresta vermelha e fria
mas estou tão distraída me perguntando como parei aqui e me recriminando por ser tão burra e egoísta que acabo me enfiando em um atalho
então vem descendo e logo nos alcança o peito um tsunami imenso e intenso
e nossas mentiras nunca tiveram raízes fortes
disso nós sempre soubemos.
(talvez porque nunca tenhamos acreditado que de fato sabíamos o que estávamos fazendo)

quando a culpa e a vergonha me atingem já é tarde demais
tento correr e expulsar todos os sentimentos obscuros através de sussurros e gritos
mas já estou dentro do alçapão e meus tornozelos estão feridos e o barulho do vento é ensurdecedor

talvez eu seja humana e racional e dona de mim
mas é tudo inútil quando estou enfr(aquecida) por grades que não passam de um borrão distante e por vozes que fazem com que eu me sinta nada mais que um animal estúpido e errante.

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