22 de agosto de 2022

i am both in love and fearing the future

    Tenho buscado uma palavra sem descrição ou uma descrição sem palavra. Talvez exista palavra, talvez exista descrição; separadas, desconectadas, avulsas no universo dos sentimentos inexplicáveis e não catalogados. Alguém as desconectou? Alguém em tentativa de censura, como fariam em uma distopia onde a violência é um passado impronunciável e o futuro é um conceito vazio? Eu?

    É nostalgia, mas não do passado. Uma saudade do presente. Nos últimos dias, parece que vivo à espera e com medo do próximo dia. Eu gosto tanto da vida aqui, agora, e ainda assim, não é nela que me sinto. Me sinto em eterna contagem regressiva, em busca do dia em que a tatuagem vai ter cicatrizado, o dia de comprar um vestido bonito, o dia de terminar aquele texto, o dia de dar aquele abraço. Mas acima de tudo, em busca daquilo que não posso controlar, que não posso planejar ou prever: o dia do respiro aliviado, do conforto em uma pele que é minha e habita o mundo por completo e não se sente tocando as unhas no vidro de um globo de neve grande cheio de cores e em movimento. 

    E se tudo que acordou diferente em mim for disfarce e as partes ruins estão aqui adormecidas e prestes a despertar? E quanto ao que falta, ao que aguarda contato com o mundo lá fora? Terei eu a capacidade de confrontar isso finalmente?

    Sinto falta desse globo de neve, por mais que eu tenha me colocado de fora dele tantas vezes compulsoriamente. E anseio por estar dentro dele, em ar, água, fogo e terra. Mergulhar os pés na água, me aquecer, dedos na terra molhada, respirar, respirar, respirar. É tudo que me alimenta, tudo que faz meu coração bater.

     Essas primeiras palavras saíram quando o mundo começava a voltar aos eixos pré-pandêmicos. Aquele momento trouxe traumas antigos, uma familiar sensação de observar o mundo de fora. Foi assustador, porque é um sentimento que eu achava ter superado por inteiro. Nos últimos dois anos, aprendi a me amar e me sentir protagonista de uma história que só eu posso escrever. Foi e tem sido um processo longo, de me condicionar a ser mais gentil comigo mesma, acima de tudo. De tornar a vida mais leve.

    Alguns meses se passaram. Resolvi respeitar meu tempo e precisei reaprender meus limites, tentando não confundir limite e medo. Ainda é um constante aprendizado, acho até que eterno. Aprendendo e vivendo, vivendo e aprendendo, simultaneamente. Mas agora, há tanto acontecendo e tantos limites e medos sendo testados que todas as inseguranças voltam com tudo. É tanta sobrecarga que mal dá absorver uma coisa por vez. É tanta sobrecarga que não consigo processar o que mais precisava ser processado no agora: um momento de transição e celebração muito diferente do que eu imaginava. Com minha mãe e minha irmã em outro estado, com meu pai e minha avó em outro plano espiritual.

    É tão estranho. Vou me formar, finalmente. Em um lugar que eu nem pensava ser pra mim. O que me faz ver, ao menos, que nem toda lacuna de imaginação vazia é ruim. Para o bem e para o mal, vai ser diferente do que eu esperava. E por mais que vá comemorar isso na presença de algumas pessoas especiais pra mim, tantas vão fazer falta e isso faz eu me sentir tão sozinha, no fim das contas. Devo ficar feliz por cantar minha história feliz, ou triste por ver alguns assentos não preenchidos? Sempre vai ter uma parte de mim vazia, como esses assentos? Eu tinha pavor de pensar em todos os futuros sem meu pai, e agora que um deles chegou, eu não sei o que fazer.

    Sei o que não queria: ter tanto medo. Me ver acuada, me sentir descartável e preterível. Observar aquilo que eu tinha de sólido ameaçando se desmanchar e aquilo que eu tinha de instável explodir sem que eu possa correr pra um abrigo, longe de todos os destroços. Ter que seguir pisando em cacos de vidro com os pés já machucados. Agora eu odeio alturas. Odeio estar fora do controle. Odeio palavras comedidas, mas odeio ainda mais aquelas que não são nada pensadas. Odeio a necessidade de ser compreensiva e odeio fingir que está tudo bem. Não está. 

    No fim das contas, vou fazer o que sempre faço. Tentar ouvir a voz do amor que se foi e do amor que se faz.

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