3 de outubro de 2018

Esquecer e lembrar e esquecer e lembrar

a mente barulhou. não de uma maneira atordoante como às vésperas de uma crise ansiosa. só foi um dia comum, em que vários pensamentos se embaralharam e eu sentia que precisava desembaralhar, mas sem sucesso absoluto. consegui pensar e quase separar e unir tudo. só não consegui colocar tudo em um papel. na verdade, não consegui colocar nada em lugar nenhum. ficou só na minha mente, e depois quando tentei me lembrar, era só um borrão cheio de coisas. então eu li algo e esse algo me levou lá de novo: falava sobre como todas as versões de nós existem simultaneamente, mesmo que repousando na memória de uma outra pessoa. pra cada mulher que se olha no espelho e não gosta do que vê, tem uma garotinha rindo consigo mesma, adorando a própria companhia, dançando, flutuando. pro suspiro cansado da noite de segunda, existe aquele beijo na testa regado de cuidado que a gente deu na sexta e que significou um monte. partes que se completam e vivem ao mesmo tempo, fazendo de tudo imortal. nós somos "todas as cores em uma, em pleno brilho".

é fácil não se tocar disso, ou mesmo esquecer. nos dias ruins. nos dias em que nada nos acolhe. quando o sentimento de estar desencaixado no mundo é pesado demais. o de odiar todas as palavras cuspidas e achar que um simples cumprimento foi estranho demais e que você deveria ser trancada numa sala até aprender a ser gente. o de não se sentir merecedor de nada de bom, o de que tudo é uma farsa prestes a ser revelada ao público. o de ser uma personagem secundária. uma intrusa. e em seguida, uma ingrata, culpada por sentir todas essas coisas, sentir que o que você sente é o que vai ser sua ruína. e lá fora, ao redor, até dentro, mas sempre ao redor, tudo continua colorido, te fazendo parecer ainda mais cinza. nesses dias é difícil lembrar que nós somos mais que uma, mais que esses dias, mais que nossos pensamentos e emoções. que não sou farsa, nem intrusa. que sou uma história cheia de cores, viva, brilhando, e que mesmo que eu seja e tenha história, ela não me define.

parecia que isso já tinha cruzado minha mente antes. e tinha. quando falava aqui sobre crescer e conviver com passado e presente sob a mesma pele, descobrindo um mundo menos mágico, mas nunca perdendo a fé por completo, muito por aquela criança que ainda existe em um cantinho da alma. a criança que nós precisamos abraçar.

outro texto me vem à mente. um que escrevi em um dos dias cinzas. "a voz que não posso esquecer". eu me esqueço de tudo, até me lembrar de tudo. me esqueço que um dia me encorajei a recomeçar, a reencontrar minha fé, a me permitir sem medo, a não deixar que os buracos me preencham. me esqueço de abraçar minha criança. me esqueço de soltá-la. me esqueço de tudo aquilo que importa. sai a lucidez, vêm as coisas irreais. me lembro de que sou descartável, sozinha, desistente, inútil. e mesmo quando é disso que me lembro e é daquilo que me esqueço, me forço a ir pelo lado bom. nem sempre dá certo. mas eu escolho sobrepor as coisas que não posso esquecer mesmo quando não consigo me lembrar com clareza delas. e isso é uma coisa que gosto em mim (frase difícil de se dizer).

começo a ligar tudo aquilo que já escrevi e me sinto repetitiva, como se não tivesse aprendido nada. estou errada. pelo menos essa parte de mim. a outra diz o seguinte: é claro que nós caímos em buracos extremamente parecidos, mas eles estão em partes diferentes da estrada. continuamos caminhando. ainda é progresso.

poderia ser mais. 

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